segunda-feira, 31 de maio de 2010

O Buraco da Agulha

Por uma hora ficaram os dois sentados, sem falar, Apenas uma vez Baltasar se levantou para pôr alguma lenha na fogueira que esmorecia, e uma vez Blimunda espevitou o morrão da candeia que estava comendo a luz e então, sendo tanta a claridade, pôde Sete-Sóis dizer, Por que foi que perguntaste o meu nome, e Blimunda respondeu, Porque a minha mãe o quis saber e queria que eu o soubesse, Como sabes, se com ela não pudesete falar, Sei que sei, não sei como sei, não faças perguntas a que não posso responder, faze como fizeste, vieste e não perguntaste porquê, E agora, Se não tens onde viver melhor, fica aqui, Hei-de ir para Mafra, tenho lá família, Mulher, Pais e uma irmã, Fica, enquanto não fores, será sempre tempo de partires, Por que queres tu que eu fique, Porque é preciso, Não é razão que me convença, Se não quiseres ficar, vai-te embora, não te posso obrigar, Não tenho forças que me levem daqui, deitaste-me um encanto, Não deitei tal, não disse uma palavra, não te toquei, Olhaste-me por dentro, Juro que nunca te olharei por dentro, Juras que não o farás e já o fizeste, Não sabes de que estás a falar, não te olhei por dentro, Se eu ficar, onde durmo, Comigo.

Memorial do Convento, José Saramago

sábado, 8 de maio de 2010

«Gérard de Nerval, o romântico hipersensível e alucinado que viveu, como disse o seu amigo de sempre Théophile Gauthier, tão intensamente na fantasia que a realização dela nada lhe traria de novo (...)»
Isto está escrito na contracapa de um volume de umas colecções de contos obscuras (Ficções) e é das coisas mais bonitas que li recentemente.